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Só por si a iniciativa de exibir um conjunto significativo da importante obra gráfica de João Abel Manta, é assaz louvável. Artista dos maiores que Portugal conheceu neste domínio, não apenas pelas suas elevada qualidades nos planos estético e técnico, com um design marcadamente pessoal inovador, mas também pela sagacidade da sua crítica mordaz exercida corajosamente nas condições particularmente difíceis da ditadura do “Estado Novo” – atente-se na série “Caricaturas portuguesas dos anos de Salazar” e em obras como a “Indigestão por falta de condimentos histórico-patológicos” (1970) –, e prosseguida em novos moldes no pós-25 de Abril, propiciando uma reflexão bem humorada sobre as contradições do processo de democratização da sociedade portuguesa, apontando tanto os seus defeitos como as virtudes, as suas misérias e grandezas (é verdadeiramente impagável a trilogia “O boato” (1974): 1. Técnica individual ou progressão em cadeia ; 2. Técnica de grupo ou a estratégia do café ; e 3. Técnica literária ou o jornalismo sensacionalista).
Num registo mais estritamente ilustrativo da sua obra, avultam os retratos de escritores portugueses (Luís de Camões, Almeida-Garrett, Eça de Queirós, Camilo Pessanha, Cesário Verde, Mário de Sá-Carneiro, António Botto, José Gomes Ferreira, José Cardoso Pires, etc.) e um brasileiro (Jorge Amado) mas nem aqui o artista foi menos acutilante, revelando uma enorme capacidade de filtrar os traços de carácter e não apenas os fisionómicos, bem como de personalidades históricas (rei D. Sebastião, Marquês de Pombal). Tudo boas razões para a visita, além de muitas outras que certamente irão surpreender o espectador.
Acresce que em Portugal raras vezes vemos uma exposição bem montada e com informação adequada ao visitante. Na sua aparente simplicidade, revela pela clareza dos itinerários propostos, uma competência profissional que não abunda nos nossos museus e espaços de exposição de arte. É de salientar a correcta colocação das obras e a ordenação das mesmas, bem como a legendagem clara e bem visível mas sem inusitadas ofuscações, tudo contribuindo para uma boa legibilidade estética e informativa.
Estão, pois, de parabéns o Museu Bordalo Pinheiro, a sua direcção e o comissário desta exposição João Paulo Cotrim.
Hélàs, há que registar um pequeno senão que não anula o que dissemos: é certo que as obras de João Abel Manta falam por si, mas não teria sido despiciendo incluir textos de explanação e enquadramento crítico nos painéis que segmentam tematicamente a exposição.
JZ /18-11-2008-